quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Palhaços, por Claudio Domingos Fernandes


No sábado tive o prazer de acompanhar alguns amigos ao teatro. Fomos assistir no Galpão do Folias ao espetáculo Palhaços de Timoncheco Whebi, com Dagoberto Feliz e Danilo Grangheia e Direção de Gabriel Carmona.

Palhaços retrata os bastidores de um circo, especificamente o camarim de um palhaço, este espaço é invadido por um espectador – um vendedor de sapatos, que quando criança desejou companhar um Circo que passara por sua cidade, mas o pai o impedira com uma surra (lembrei-me de meu texto vara de marmelo). O encontro deste dois seres coloca diante de nós – palhaços de todos os matizes – a questão sobre a arte e o artista.

"Para que serve o artista?" pergunta Gabriel Carmona no manifesto que apresenta o espetáculo. E se a arte é a escolha de um olhar, um ponto de vista, sobre um mundo de acontecimentos e sensações, como ele responde no corpo do manifesto, o artista não é outra coisa que um caleidoscópio, multifacetando a realidade, ante nosso olhar.

A questão do artista e de seu público fica, então, patente no desenrolar da trama em que o palhaço “vai desmontando os sonhos mais puros e os desejos mais imundos de seu fã”.

O artista só é artista porque não sabe fazer outra coisa senão arte. Ao mesmo tempo ser artista é apenas uma condição, como ser vendedor de sapatos ou espectador de um espetáculo são apenas condições, a qualquer momento podemos assumir o papel um do outro e se encontrar e se confundir neles. 

No retorno, ainda reverberando o mundo de inquietações que me suscitaram o espetáculo, o Cidão me lembrou um discurso sobre o artista. Disse ele que alguém afirmou não ser o artista um trabalhador, porque o artista não produz riquezas. Mas o trabalhador também não produz riquezas, o trabalhador apenas produz produtos com os quais não mantem senão o desejo de consumo enquanto apenas se consome. A riqueza não lhe pertence. O artista não é trabalhador não porque não produz, mas porque seu produto não é consumivel. Eu não posso apenas consumir a obra de Timoncheco, lendo-a ou fluindo-a em uma montagem. Ela me inquieta, me provoca, diz algo de mim. 

E se a arte é este provocar o olhar de si, o artista produz provocações; é o pro-vocador. E aquilo que Carmona coloca como uma incerteza ou possibilidade: “Talvez a arte seja aquele momento em que podemos olhar as coisas de maneira diferente, experimentar outras conclusões e sentimentos sobre os mesmos fatos” eu acredito ser o próprio da arte. Neste sentido, o artista está na condição do trabalhador: produz, mas não riquezas. Esta não lhe pertence. Por isso, não se pode esperar viver da arte (a segunda sessão terá menos espectadores que a primeira). O artista, no entanto, se coloca, ao mesmo tempo, sobre outra condição, seu produto não é consumível, porque esta é a grandeza de uma obra de arte: perdurar provocativa para além de seu tempo-espaço. A arte não é o produto, a tela pronta, o espetáculo apresentado, a escultura exposta, o livro editado etc. É o que aguça o olhar, amplia a capacidade de reflexão, dá uma outra dimensão ao ser humano, esvazia-o de atributos, desconcerta-o, dá-lhe a possibilidade de se reinventar e fugir aos determinismos de todos os gêneros num olhar retro-intro- expectivo. O artista não se sustenta com sua arte, sua arte o eterniza. Timoncheco Whebi é atualíssimo.

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